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O mundo gira, a ciência avança cada dia mais rápido... mas as pessoas comuns conseguem perceber com consciência de que forma as evoluções tecnológicas contribuem (ao menos em intenção) para o desenvolvimento e manutenção de suas vidas? Afinal, é para elas e por elas que a tecnologia e a pesquisa existem e que também definem, em grande parte, as tendências da ciência.
Pensando na importância que a transgenia tem para os seres humanos nos últimos anos, principalmente em se tratando de alimentos e saúde, resolvi abordar o tema dos transgênicos a fim de elucidar alguns pontos do assunto que muitos ouvem falar, mas desconhecem em essência do que realmente se trata ou como funciona.
Entender, neste caso, é muito importante, pois a discussão de se os alimentos devem ser comercializados no Brasil (e isto definirá indiretamente se poderão ser plantados) deve vir do mercado mais importante: as pessoas comuns. A polêmica é ferrenha e vem dos mais diversos segmentos da sociedade como ecologistas, cientistas, governo, produtores rurais, comerciantes e pessoas comuns.
Transgênicos envolvem um assunto muito denso e extenso. No entanto, tentarei fazer um breve resumo do que é e qual sua finalidade atual para que o leitor possa ter algum subsídio para tomar a sua importantíssima decisão de julgar se lhe interessa consumir alimentos transgênicos ou não, se é importante para a sociedade conviver com esses produtos ou não, etc.
As técnicas modernas de engenharia genética permitem que se retire genes de um organismo e se transfira para outro. Esses genes "estrangeiros" quebram a seqüência de DNA - que contém as características de um ser vivo - do organismo receptor, que sofre uma espécie de reprogramação, tornando-se capaz de produzir novas substâncias. Esses são os chamados transgênicos, ou organismos geneticamente modificados (OGMs).
Alimentos Geneticamente Modificados: são alimentos compostos contendo organismos geneticamente modificados ou derivados destes. São produtos criados em laboratórios com a utilização de genes de espécies diferentes de animais, vegetais ou micróbios.
Organismos Geneticamente Modificados: são definidos como organismos que tenham sido alterados geneticamente por métodos ou meios que não ocorrem naturalmente.
Modificação Genética: são técnicas que incluem DNA recombinante, introdução direta em um organismo de material hereditário de outra espécie - incluindo micro-injeção, micro-encapsulação, fusão celular e técnicas de hibridização com formação de novas células ou novas combinações genéticas, de maneira que não ocorre naturalmente.
Gene Inseticida: é o gene introduzido na planta para que ela passe a produzir substâncias de resistência a seus insetos predadores.
Engenharia Genética: é a atividade de manipulação de moléculas DNA/RNA recombinante. DNA/RNA Recombinante são aquelas moléculas de material genético manipuladas fora das células vivas, mediante modificação de segmentos de DNA/RNA, natural ou sintético, que possam multiplicar-se em uma célula viva - ou ainda, as moléculas de DNA/RNA resultantes desta multiplicação.
Para aumento da produção agropecuária, reduzindo-se o uso de adubos químicos e agrotóxicos, é necessário armar as plantas e animais domésticos com defesas genéticas contra patógenos e pragas, iniciando-se na década de 70 a engenharia genética com a transferência controlada de genes. As vacinas transgênicas e a terapia genética pela injeção de células transgênicas multipotentes, do próprio indivíduo,são outras formas poderosas de defesa genética.
Como espécie dominante, a população humana tende a ocupar todo o espaço vital, podendo excluir todos os demais seres, exceto os que decidir preservar para seu proveito. Entretanto, qualquer espécie vegetal, animal ou de microorganismos pode ser preciosa doadora de genes, previamente escolhidos, para a espécie receptora.
Quando é conseguida a integração do gene, com seu promotor em uma planta, uma série de testes rigorosos são executados para verificar se o gene, incorporado no DNA do organismo transgênico, está produzindo o seu RNA e a proteína correspondente. É determinado em que tecidos ou órgãos está ativo o transgene, de acordo com o controle exercido pelo sistema genético regulador por intermédio do promotor acoplado ao transgene. O promotor é uma porta "fechada a sete chaves". Cada uma é um sítio pelo qual somente o sistema de controle transcricional pode ativar os genes normalmente inativados pela capa de cromatina.
Somente depois de muitos testes e controles as plantas, que apresentam o resultado desejado, são multiplicadas "in vitro" passando depois para aclimatação em câmaras de cultura, “Casa de Vegetação” e finalmente para canteiros experimentais isolados, onde são selecionadas em competição com as cultivares originais sob todos os aspectos possíveis. Antes do lançamento da transgênica, como produto, são feitos testes de campo em grande escala para verificar se há vantagem dessa cultivar em relação à original. As transgênicas são liberadas condicionalmente ficando em observação permanente.
Não existem estudos conclusivos quanto aos efeitos dos transgênicos na saúde humana, portanto, não há garantia científica para o consumo sem riscos. Esse risco será suportável pelos humanos? É bom lembrar que muitos produtos hoje reconhecidamente maléficos para a saúde humana, como o DDT e a Talidomida, já foram liberados e defendidos pelas empresas produtoras e cientistas do mundo inteiro.
Um outro fator importante é que as plantas transgênicas contém genes de resistência a antibióticos, com a função de possibilitar a seleção das células transformadas, isto é, são usados como marcadores. Esses genes podem, através de recombinação e/ou transferência horizontal, serem transmitidos a outros organismos, inclusive humanos? Ainda, os transgênicos poderiam afetar a saúde com o aumento de alergias; potencialização dos efeitos de substâncias tóxicas: muitas plantas possuem substâncias tóxicas naturais para se defender de seus inimigos naturais; se manipulados geneticamente, os níveis dessas toxinas podem aumentar; aumento de resíduos de agrotóxicos: alguns dos produtos transgênicos têm como característica se tornarem resistentes aos efeitos dos agrotóxicos (soja "roundup ready"), o que permite que seja aplicado mais veneno (agrotóxico) na plantação, cujos resíduos permanecerão nos alimentos, podendo também trazer mais risco de poluir os rios e o solo.
Em torno de 8% da população mundial tem alergia a proteínas contidas na soja44. A introdução de genes externos no código genético das plantas pode vir a desencadear a produção de novas proteínas. Ao se introduzir na alimentação humana plantas transgênicas, direta ou indiretamente, estamos ingerindo as proteínas fabricadas por estas plantas, sejam elas já conhecidas ou sintetizadas a partir da introdução genética. Não existe no mundo, ainda, nenhum grupo de monitoramento a este tipo de procedimento.
Sabe-se que a composição de uma soja transgênica e de uma orgânica pode diferir em até 74%. O que torna mais difícil uma análise mais completa sobre os impactos desses novos organismos é que muitas vezes suas conseqüências só podem ser sentidas a médio e longo prazo. Todos os alimentos importados dos EUA e da Argentina, e que tenham algum ingrediente derivado de soja, milho ou batata poderá conter transgênicos. (Cabe lembrar que os derivados da soja estão presentes em 70% dos alimentos que consumimos, como massas, pães, molhos, etc). Alguns exemplos de alimentos que contém como matéria prima produtos geneticamente mudados: Batata Pringles, Sorvete "Hag en Daz", Chocolate "m&m", entre outros.
Vantagens:
* Toda a variabilidade genética dos organismos da Terra fica a nossa disposição, portanto não haverá jamais exaustão da variabilidade genética para o melhoramento de vegetais e animais domésticos;
* Em uma "construção", é possível usar um gene e um promotor para funcionarem da maneira programada no tecido ou órgão, com a intensidade e no tempo do desenvolvimento do organismo escolhido. Também é possível usar promotores que superativem o gene com o aumento ou redução da temperatura ou luminosidade ambiente;
* Obtém-se plantas resistentes a insetos pragas, a herbicidas, a metais tóxicos do solo, a fungos, ao amadurecimento precoce, com maior teor protéico e proteínas mais completas, óleos mais saudáveis, arroz com carotenos, etc.;
* São as plantas transgênicas, com suas defesas genéticas, que representam a esperança de uma efetiva redução dos agrotóxicos dos custos de produção com aumento de produção.
Desvantagens:
* Somente poucos laboratórios tem os dispendiosos equipamentos e reagentes e pesquisadores capazes de obter organismos transgênicos com toda a segurança requerida pela Lei de Biosegurança, fiscalizada pela Comissão Nacional Técnica de Biosegurança CTNBio;
* Após a obtenção do organismo transgênico, segue-se a fase mais longa e dispendiosa, de cinco ou mais anos, e milhões de dólares para selecionar e desenvolver o produto. Somente Empresas têm arcado com os custos necessários para lançar novas transgênicas;
* Apesar de todas as precauções as pessoas leigas, ou mesmo pesquisadores de áreas afins, temem que possam existir inconvenientes no futuro;
* Apesar de serem as transgênicas cultivadas em 39,9 milhões de hectares e consumidas por milhões de pessoas há mais de dez anos sem inconvenientes, é fácil para organizações leigas assustar, sem provas, os consumidores submetidos a propagandas movidas a milhões de dólares. O público amedrontado paga essas organizações para ser "informado";
* Os alimentos "orgânicos", isentos de agrotóxicos e transgênicos, parecem ideais, entretanto a sua produção é mais cara, demanda muito trabalho, espaço e não passa de 1% do necessário. Infelizmente orgânicos foram os alimentos dados às vacas e aos porcos na Inglaterra que se contaminaram com graves doenças. Também o estrume de vaca usado na cultura de verduras "orgânicas" pode conter uma bactéria Escherichia coli 715 H7, que é letal.
Para finalizar, é importante destacar que as pesquisas de percepção pública sobre a biotecnologia, especificamente sobre as plantas transgênicas, tem mostrado o baixo nível de aceitação tanto nos Estados Unidos, como na Europa e no Japão. Portanto, este fator também precisa ser considerado, e é pelo temor dos riscos que as populações especialmente da Europa e do Japão estão exigindo a rotulagem como forma de possibilitar ao consumidor a decisão sobre o seu uso.
Mais do que isto estão dispostos a comprar produtos preferencialmente convencionais aos transgênicos. Desta forma, essa rejeição aos transgênicos tem sérias implicações no mercado de grãos e põe, para um país exportador como o nosso, a necessidade da discussão dos impactos econômicos de uma decisão de liberar plantas transgênicas para qualquer uma das as culturas de cultivo intensivo.
Nesse momento, não há como desprezar a importância da nova indústria decorrente da manipulação genética dos seres vivos, a considerar pelas fusões e a transferência de grandes empresas da área química para a biotecnologia. Há inegáveis benefícios decorrentes dessa tecnologia que veio para ficar. No entanto, a sociedade deve dispor de meios para evitar que os erros cometidos no passado decorrente da avaliação equivocada dos riscos não venham a se repetir.
Por todos esses motivos, a comunidade científica entende que deve ser feita uma moratória de 5 anos para a liberação das plantas transgênicas para cultivo intensivo, tempo necessário para que os estudos de impacto ambiental sejam realizados conforme o parecer técnico emitido pela CTNBio. Este período de tempo servirá também para a realização de novos estudos sobre o efeito destes produtos na saúde humana e dos animais.
Por outro lado, consideramos que a CTNBio após normalizar os protocolos experimentais dos testes de controle ambiental e de segurança alimentar, deve analisar os resultados dos testes realizados no país, antes de aceitar o pedido de liberação para cultivo intensivo. A apresentação de testes realizados em outros países não podem ser considerados válidos dada a variabilidade de expressão gênicas com condições ambientais próprias de cada país.
É um direito do cidadão conhecer o tipo de alimento que está consumindo, sendo, portanto, importante a rotulagem dos alimentos transgênicos com a indicação precisa do tipo de gene inserido. Essa exigência é tanto mais importante considerando-se a abertura da fronteira agrícola com os países do Mercosul. Afinal, por exemplo, a Argentina produz a grande maioria da sua soja, e produtos derivados, com transgênicos, vindo posteriormente a exportar para o Brasil, apesar de ainda toda a indefinição desse assunto no país. E, o mais importante de tudo, você tem todo o direito de argumentar e de cobrar das autoridades, ouvindo todas as partes envolvidas e apreender toda a informação que puder para debater o assunto.
Porque o grande perigo da ciência e das sociedades é a desinformação.